Karonte

Karonte é uma terra esquecida pelo Criador, onde os dias são quentes como Dante, e as noites frias como Cocito. Semanas de dez dias, dias de quarenta horas. A comida dos homens era bravamente conquistada pela caça de animais selvagens, e a bebida provinha das escassas chuvas que vez em quando caíam pela noite. 

Os homens eram basicamente divididos em bárbaros, civis — que compunham a maioria —, clérigos e nobres. 

Há centenas de anos, Karonte foi governado pelos seres alados, conhecidos como anjos, que cuidavam de estabilizar a harmonia daquela terra, incluindo sua natureza e meio ambiente. Viviam no Monte Deva, no Palácio Carmesim, mantendo o governo soberano perante os homens.

O líder dos anjos, Genos, era conhecido por sua benevolência e piedade para com os humanos, considerando-os como seus próprios filhos, dedicando seu amor a eles, priorizando a fartura e bem estar dos habitantes daquele mundo.

Foi então que um homem, nascido da nobreza, descobriu por acaso a fonte da vida e da magia dos anjos. O coração humano deste homem percebeu que tal fonte poderia ser usada não só para construir, mas para manter e destruir. Manter a vida frágil e limitada dos homens fortes. Destruir a vida frágil e limitada dos homens mais fracos. 

Abel, o anjo rebelde, expulso do Palácio Carmesim por demonstrar busca por interesses próprios e inveja para com os homens, percebendo os propósitos sombrios deste humano, conseguiu um pouco daquela energia para forjar uma espada de prata, banhada pela magia, único instrumento capaz de matar divindades. Tal instrumento fora batizado de Nakata, a feroz.

O humano que recebeu tal arma certificou sua eficiência contra os anjos ao decapitar o próprio forjador. Com a espada Nakata em punhos, suja pelo sangue de Abel, seu manejador ficou conhecido como Thamas, o invencível.

Thamas reuniu e comandou exércitos crescentes, ordenou a destruição de nações, dizimou populações, reduziu às cinzas civilizações e culturas, com o propósito único de se tornar o governante absoluto dos homens. 

Os anjos souberam de sua fama tarde demais. As tropas de Thamas invadiram o Palácio Carmesim e iniciaram a chacina, enfraquecendo os seres divinos com lanças e flechas, para serem decapitados pela Nakata.

Mais de cem anjos caíram no escuro véu da morte naquela noite conhecida como Teocídio. Os anjos remanescentes se refugiaram, e até hoje vivem escondidos, camuflados entre os outros homens. Genos também havia desaparecido e dado como morto. Alguns especulam que ele continua vivo, sob a custódia de Thamas, que bebe diariamente seu sangue, para se fortalecer e se tornar indestrutível e imortal. 

Karonte é povoado pelos bárbaros, pelos civis, pelos clérigos e pelos nobres, cada classe com seus respectivos representantes. Mas todos eles se curvam perante Thamas, o Senhor da Carnificina.

Porém, rugidos ferozes foram ouvidos nas Regiões Desabitadas, ao sul, onde se encontram centenas de vulcões que, desde o Teocídio, entraram em atividade constante...